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sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

AS CANGACEIRAS "ARISTÉIA” E "ELEONORA"


Fotos: Cortesia do escritor João de Sousa Lima
A fazenda Lajeiro do Boi, em Canapí, Alagoas, era sempre visitada tanto por cangaceiros quanto por policiais. Os proprietários desta fazenda era o casal José soares e Maria dos Santos Lima. Eles tiveram os seguintes filhos: Eleonora, Benedita, Dasdôres, Valdemira, Luiza, Maria, Aristéia e Antenor. Todos nascidos no Capiá da igrejinha, local onde fica a fazenda Lajeiro do Boi.

Das filhas do casal José Soares e Maria Santos Lima, duas engrossaram as fileiras do cangaceirismo. Uma indo por prazer, outra sendo forçada. A primeira entrar no bando foi Eleonora. Ela seguiu o cangaceiro Serra Branca.

Aristéia Soares de Lima nasceu em 23 de junho de 1916 (portanto, no próximo dia 23, fará 96 anos de idade) e lembra-se bem da passagem dos cangaceiros Corisco, Virgínio e Luiz Pedro em sua casa, sendo que por diversas vezes, outros cruzaram o terreiro da fazenda Lajeiro do Boi.

Tendo seu nome envolvido como coitera de cangaceiros e temendo a ação vingativa dos policiais, Aristeia fugiu para fazenda alto vermelho, entre lajinha e campo, próximo a Santana do Ipanema, indo refugiar-se na casa das tias Mariinha, Zifina, Santa e Maria grande. Por essa época, Eleonora, sua irmã, já se cobria com a mescla azul e os bornais enfeitados com os desenhos de flores coloridas.
Cícero Garrincha já tinha certa queda por Aristéia e assim que abraçou a nova vida do cangaço começou a rondar a fazenda da família da moça. Em uma dessas passagens, ele foi avisado pela amiga Celina, da localização de Aristéia. Cicero seguiu para fazenda Alto Vermelho e depois de conversar com a escolhida, sem usar a força, conseguiu que ela, mesmo contra sua vontade, acompanhasse o cangaceiro.

O novo casal seguiu ao encontro do grupo de Moreno que os aguardava no coito conhecido por Pilão das Pêia Junta, próximo à casa de Aristéia.

No esconderijo, Aristéia foi festivamente recebida. Durvalina manejou a velha máquina de costura e fez um vestido para nova amiga, completando o figurino com bornais floridos e um chapéu de feltro. Logo após a entrada de Aristéia, suas primas Sebastiana e Quitéria seguiram os cangaceiros Moita Brava e Pedra Roxa.
ARISTÉIA CHORA A MORTE DA IRMÃ, A CANGACEIRA ELEONORA.

Eleonora vivia com o cangaceiro Serra Branca, que chefiava um grupo de aproximadamente cinco cangaceiros. Grupo esse pouco conhecido por viver sempre escondido nas terras alagoanas. Os cangaceiros desse bando não ganharam destaque em combates, saques e nem crimes, fugindo da realidade do mundo que cercava os caminhos do cangaceirismo, vida cheia de entrechoques perigosos e violentos.

No dia 20 de fevereiro de 1938, com as rodagens cercadas por policiais, que davam segurança e proteção ao interventor Dr. Osmar Loureiro, de viagem pelos sertões alagoanos, o tenente João Bezerra deixará sua volante nas proximidades do Inhapí, ao cômodo do soldado Juvêncio, totalizando nove homens no grupo, que estavam arranchados perto de uma cacimba.
Os soldados estavam bem á vontade ao redor da cacimba, desarreados dos bornais, chapéus e cartucheiras, estando alguns sem alparcatas.

Com o amanhecer, entre nove dez horas, enquanto Antonio Jacó tirava água do riacho, ele observou um cachorro que se aproximou da cacimba e desconfiou que, pela ornamentada coleira que possuía, só podia ser cachorro de cangaceiro. Os soldados tinha realmente razão, era o grupo de Serra Branca que vinha se aproximando.

O chefe trazia nas costa, uma banda de bode, sendo seguido pela mulher Eleonora e mais dois companheiros, entre eles o Ameaça. Antonio Jacó viu quando o soldado Cornélio levantou-se e empunhou o fuzil, se preparando para atirar, enquanto ele ajeitava, na cintura, suas cartucheiras com vinte e cinco cartuchos. O tiro zoou, partindo da arma de Cornélio Jacó correu em perseguição aos cangaceiros, sendo acompanhado pelo soldado Zé Gomes. Na frente de Antonio Jacó corria o cangaceiro Serra Branca e na frente tentava fugir Eleonora. Jacó gritou:

-Se vira cabra, pra brigar. Se vira pra brigar!

(Acompanhem a perseguição sendo relatada pelo próprio Antonio Jacó):

"-Eu atirando, atirando e correndo. Aqui e acolá ele (o cangaceiro) se virava, dava um tiro e corria. Até que ele se apadrinhou numa catingueira, mas ficou assim meio de fora eu tive a oportunidade de atirar bem nele. A bala pegou assim na altura da pá com as costelas e saiu do outro lado. Ele se torceu, jogou a banda de bode prum lado e correu. Aí eu vi que tinha ferido ele, porque das costas saia sangue. Quando ele saiu correndo eu sai na carreira atrás dele de novo. Adiante tinha um riacho, ele pulou embaixo, já com pouca força.
O riacho tinha assim um metro e meio de fundura, mais tava seco. Na carreira que eu ia nem deu para parar na ribanceira do riacho. Ele tava com o rifle armado e pronto para atirar e como não deu pra mim parar eu pulei encima dele. Ele assombrou-se com o que viu e correu. Quando ele virou as costas, ai eu aproveitei e pá. Ele caiu debruçado. Mais eu vi que ele não tinha morrido. Quando ele caiu, a mulher (Eleonora) que ia na frente dele viu que ele não podia mais correr, virou-se abriu os braços.

Não sei porque ela abriu os braços assim, porque foi tudo rápido, não deu para pensar em nada. Naquele instante, Zé Baixinho vinha atrás de mim e eu não sabia que ele vinha atrás de mim, acompanhando aquela correria toda. Zé Baixinho que vinha correndo mirou o mosquetão e atirou na mulher de braços abertos (Eleonora) e acertou bem no meio da testa . Foi um tiro só. A mulher (Eleonora), tombou no chão na mesma hora.


O soldado Zé Baixinho aproximou-se de Serra Branca . O cangaceiro apesar do tiro que havia tomado, levantou-se e atirou. Zé Baixinho caiu entre os matos. 
Antonio Jacó atirou no estômago do cangaceiro acabando de matá-lo. Zé Baixinho levantou-se apenas atordoado pelo susto do tiro, sem ser ferido.
Antonio Jacó cortou a cabeça do casal, amarrou um crânio no outro pelos cabelos e retomou trazendo os dois troféus, na direção da cacimba, onde estavam arranchados.

Na cacimba, Cornélio estava com a cabeça do cangaceiro Ameaça, separada do corpo cortada por facão. O tenente João Bezerra que estava um pouco distante na hora do tiroteio, mas que havia ouvido os tiros, já se encontrava na cacimba quando Antonio Jacó foi avistado seguindo por dentro do riacho, trazendo as cabeças e os pertences dos cangaceiros.
Os soldados levantaram as cabeças cortadas mostrando-as aos amigos. Depois de alguns minutos de conversa, diante da observação do tenente João Bezerra, foi que eles foram ver que Antonio Jacó tinha perseguido os cangaceiros, estando descalço, sem camisa e sem chapéu .

Os soldado retornaram pra Piranhas/AL, transportando as cabeças. De Piranha foram pra pedra de Delmiro e de lá seguiram pra Santana di Ipanema, onde entregaram as cabeças aos coronéis Zé Lucena e Teodoreto de Camargo Nascimento . Os coronéis deram a patente de cabo a Antonio Jacó que repassou a patente para o amigo Juvêncio.
Em Santana do Ipanema, os soldados Cornélio, Zé Baixinho, Elias, Octácilio, Zé Gomes e mais alguns companheiros, prestaram contas aos seus superiores hierárquicos, tendo por provas os crânios das vitimas abatidas em combate.

Entre as macambiras espinhentas da caatinga, três corpos alimentavam animais selvagens, enquanto na fazenda Lajeiro do Boi, os pais de Eleonora sofriam a perda de uma filha querida .

ARISTÉIA soube através dos coiteiros da morte da irmã e por ela verteu lágrimas sentidas.

O padre Demuriês, que celebrava a missa na região de Mata Grande, Canapí, Inhapí e nas fazendas circunvizinhas,criava em segredo o filho de Eleonora e Serra Branca, um menino chamado Francisco de Sá .
Assim que o padre ficou sabendo da morte da amiga cangaceira, convocou alguns fiéis e foi, em segredo, enterrar ELEONORA.

O padre chegou com facilidade onde estava o corpo, sendo auxiliado por vaqueiros conhecedores da região. No local, o Ministro de Deus encomendou o corpo e o enterrou em cova rasa, aberta na urgente necessidade do momento e coberta por facheiros e macambiras, deixando sepultada uma vitima que antes de tudo fazia parte de sua vida, ficando, por recordação da amiga, um filho deixado por ela .
ABAIXO, FOTO DA VOLANTE do Ten. JOÃO BEZERRA, com as cabeças dos cangaceiros: Serra Branca, Eleonora e Ameaça

A MORTE DOS CANGACEIROS ZÉ VEIO E CÍCERO GARRINCHA 
Moreno e seu grupo empreenderam uma viagem em direção á Santana do Ipanema, saindo das proximidades da fazenda Lajeiro do Boi. No percurso, os catingueiros tiveram que passar nos pastos, fazenda com o mesmo nome do local onde morreram Eleonora, Serra Branca e Ameaça . Cícero Garrincha e Aristéia seguiam um pouco na frente do grupo, atravessando as veredas, soltando sorrisos de contentamento, curtindo a festividade da aparente gravidez, de poucos meses, da cangaceira.

Moreno, , seguia concentrado no caminho e preparado para as surpresas que pudesse aparecer ( e elas sempre apareciam ).

Apesar de cedo do dia, o sol alardeava seus raios trêmulos sobre a terra, castigando os galhos pontiagudos e as folhas secas da caatinga. Os cangaceiros riscava com suas “ percatas “ ferradas, os empoeirados atalhos alagoanos.

Os risos de Aristéia disfarçava a triste dor que perpassava a condição de sofrimento da ida bandoleira do cangaço, feito sentença cumprida na solidão e no abandono dos carrascais poeirentos dos materiais lúgubres, que geravam as ações continua de fuga, onde se igualavam atacantes e atacados.

Um pouco mais na frente, fechando a passagem de vereda por onde seguiam os cangaceiros, soldados armavam uma emboscada. Escondidos e protegidos entre as pedras e as vegetações mais salientes, eles aguardavam o momento de atacar os inimigos.

Os cangaceiros seguiam em direção á armadilha, sem desconfiar da cilada armada. Poucos passos depois, na aparente serenidade da caminhada, tiros ecoaram, calando risos e gerando tumultos. Moreno e João Garrinchaagacharam-se e retribuíram os disparos, colocando as mulheres em suas retas-guardas, longe dos possíveis ferimentos.
Travou-se acirrado tiroteio.
Um pouco á frente de Moreno, um cangaceiro atingido pelos primeiro disparos, agonizava. Pouco segundos depois, o cangaceiro Zé Velho, apelidado de "pontaria" , dava seus derradeiros suspiros.
Um pouco atrás de Zé Velho, Cícero Garrincha, o Catingueira, também tombava crivado por balas .

ARISTÉIA avistou Cícero Garrincha se arrastando, procurando sair do raio de ação dos disparos realizados pelos policiais .

Aos poucos, o matraquear intermitente das armas foram ficando compassados. Os soldados foram silenciando seus armamentos e fugindo do campo de batalha. Zé Velho tombara morto, crivado pelas minúsculas ogivas de chumbo disparadas.

Cícero Garrincha levantou-se depois de muito esforço. Suas roupas estava completamente encharcadas de sangue. Moreno se aproximou de Cícero Garrincha e, junto com João Garrincha, o transportaram para um local mais seguro.
ARISTÉIA lembrou-se do velho ditado sertanejo: “ Muito riso é prenúncio de muita dor “ .

Os cangaceiros seguiram a trilha de volta, buscando socorrer o amigo que cambaleava apoiando nos ombros dos dois fiéis amigos. Com algumas centenas de metros, já exaustos, os cangaceiros pararam. Cícero Garrincha foi colocado em uma sombra e sua camisa foi aberta dando visão ao estrago causado pelo tiro. A caixa torácica foi parcialmente destruída pelos estilhaços de uma mortal bala. Os companheiros assustaram-se diante da visão do ferimento, onde viam o coração pulsando .
A respiração ofegante do baleado, expulsava jatos de sangue, pelo largo orifício da contusão. O cangaceiro pediu água, Moreno argumentou que água naquele momento causaria danos piores, podendo levá-lo rapidamente á morte. Durvalina tirou de dentro de um dos bornais um vidro de “ saúde da mulher “ um composto usado quando das cólicas menstruais. Um capucho de algodão foi ensopado por Durvalina na solução e passado nos lábios do moribundo cangaceiro, por seguinte vezes o chumaço de algodão foi embebido no remédio e aliviado a secura dos lábios de Cícero Garrincha, enquanto seu coração arquejava descompassado, expulsando sangue borbulhante cada vez que respirava, sendo assistido por olhares assustados com a gravidade da lesão. Moreno sabia que a morte do amigo era questão de tempo. Cícero Garrincha também pressentiu o momento difícil porque estava passando. Ao lado do cangaceiro, Aristéia chorava sua angústia . Moreno olhou nos olhos do cangaceiro e perguntou:

- O que você quer que eu faça com sua mulher?

- Faça o que Deus quiser!Se pudé deixe ela com a família!

- Eu deixo!

A respiração de catingueira foi ficando insuficiente, o sangue banhava cada vez mais as mãos que segurava o corpo inquieto. O coração pulsava frágil e visível. O cangaceiro apertou com a mão, o braço de Moreno, pendeu a cabeça pro lado e expirou. As lágrimas rolaram nas faces angustiadas dos companheiros. João Garrincha assistiu, contrariado, a morte do irmão. ARISTÉIA chorou amargamente sua perda, ostentando em sua barriga saliente, um órfão prestes a nascer .
Moreno cavou, junto com a ajuda dos amigos, uma cova rasa e enterrou o companheiro, cobrindo a sepultura, com macambira e xique-xique cactáceos que enfeitam a paisagem rara do Sertão Nordestino.
Fonte:

2 comentários:

  1. Não gosto de ver cangaceiros mortos, me doi pois eu sei de que muito do que comentam não é verdade, sei que todos eram mas também sei que erraram muito com eles.lamento profundamente que ninguém de o valor que eles merecem realmente,mostrar esse guerreiros mortos é desumano e cruel.

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  2. Anônimo01:47:00

    Discordo de você Rosangêla, pois naqueles tempos sem lei em que o banditismo imperava nos sertões, não havia nada que metia medo naqueles demônios das caatingas; eles praticavam os piores e os mais diversos e perversos tipos de crimes com pessoas inocentes, eles matavam, estupravam, feriam, e mutilavam os sertanejos indefesos usando os meios mais brutais e dolorosos ainda com os piores requintes de crueldade. Estas criaturas selvagens não tinham nenhum respeito à vida nem à integridade física e moral dos pacatos cidadãos do sertão,cortando suas cabeças era uma maneira mais fácil de transporta-los e ainda tentar intimidar as abomináveis hostes da maldade.Pense você Rosangela sendo vítima, e sentindo na pele delicada de seu rosto o ferro incandescente do terrível Zé Baiano, enquanto você se contorcia de dor sentindo o odor de sua carne queimada, o tal facínora ria do seu momento de desgraça e eterna lembranças das marcas irreversíveis das suas iniciais "ZB".

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