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quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

OS LENÇOS AINDA MOLHADOS

*Rangel Alves da Costa

Madrugada de 05 de julho de 1993. O telefone tocou na hora mais inesperada e assustadora. Do outro lado, com a voz embargada, a amiga Sônia Godoy esforçou-se para dizer em poucas palavras: Houve um acidente na estrada de Canindé e seu irmão Alcimar morreu. Ele e Marcinho de Zé de Lídia.

Dois jovens, dois rapazinhos na bela flor da mocidade. Dois jovens abrindo a porta da vida, sendo mais velho Alcimar com 21 anos de idade, mas meninos ainda pelo percurso imaginado que ainda teriam pelo chão sertanejo. Um golpe duríssimo, doloroso demais, inesquecível, abrindo chagas nos corações familiares que jamais estarão completamente curadas. Por isso os lenços ainda molhados de Poço Redondo.

E Poço Redondo já perdeu muitos de seus filhos ainda jovens demais para partir. Eis sempre o pensamento humano ante o infortúnio e sempre contestando os chamados de Deus. Por mais que os destinos já estejam escritos por mãos sagradas, ainda assim muito difícil aceitar acontecimentos que sempre chegam como punhalada na alma. E os lenços molhados se encharcam de tristeza e sofrimento.

Jaminho, meu primo Jamisson Freitas, não está mais entre nós desde 05 de fevereiro de 2011, e eis um adeus angustiante demais apenas por relembrar. Também rapazinho, menino ainda, ou um jovem esbanjando simpatia, beleza pessoal, alegria e amizade aonde chegava. Inesquecível o seu jeito bonito de ser, contente demais com a filhinha Sophia, cheio de planos e sonhos. Mas eis que novamente o caminho da vida é interrompido cedo demais, num espanto anestésico que ainda nos dificulta acreditar. Por tais razões que os lenços de Poço Redondo ainda vivem melancolicamente encharcados.


Os motivos, as situações, os modos, nada disso releva quando se fala em sofrimento pela perda. Um adeus forçado, a perda do filho, do irmão, do parente, do amigo, é o que dói perante o acontecido. A despedida de qualquer pessoa próxima ou conhecida já motiva indescritível sofrimento, mas se imagine o tamanho da dor ao ter - de repente revelada diante de si - que se despedir de um jovem no seu mais belo instante da vida ou mesmo de alguém que cedo demais faz prostrar de dor a família e todo o sertão. E por isso mesmo os lenços molhados nunca secam nos varais da memória.

Manoel Messias, ou Mané Messias de Cordélia, ainda parece sorrir perante sua família e amigos de seu Poço Redondo. Com seus óculos, seu jeito inconfundível de ser, sua feição alegre, não haveria como não profundamente comover perante o acontecido, perante o adeus ainda numa fase florescente na vida. Com seu irmão Toinho, o eterno Toinho de Cordélia, mesmo numa idade já mais avançada, havia acontecido o mesmo. E assim porque sempre dilacera ter de se despedir daqueles que parecem que sempre estarão ao nosso lado.

Certamente alguns imaginam que aos poucos o tempo vai enxugando os lenços, acalantando os sofrimentos, até mesmo fazer esquecer os entes queridos e seus adeuses. Ledo engano. Não há tempo ou idade que faça deslembrar ou diminuir na memória quem realmente se ama e que, pelos chamados de Deus nos acasos da vida, já não se fazem presentes nos seios familiares, entre os amigos, na normalidade da existência. Não há como se esquecer da vida presente em Leto, nosso amigo Juquinha. A dor de ontem certamente será o mesmo sofrimento toda vez que o coração ou a memória chamar o seu nome, relembrar sua face amiga entre nós.

E tantos e tantos amigos, parentes, conhecidos, já partiram assim, na flor da idade, nos anos de bem viver, em instantes ainda produtivos. Arnon de Dona Hélia, como era mais conhecido. Hélio e Zélio de Tonho de Ulisses, Elder, Gladston, Arnon Dias de Adelvan, Zé de Delino. O nome de Zé de Delino, aliás, nem precisaria ser relembrado pelas pessoas, parentes ou amigos, pois é o próprio Poço Redondo, no seu chão e seu caminho, que haverá sempre de cultivar sua memória.

Não precisam dizer que me esqueci de mencionar muitos outros nomes. Sei disso. Reconheço a falta de menção, mas é que o espaço é curto e os lenços se encharcam ainda mais. E a memória, as lembranças e as saudades nos chamam a fazer orações. 

Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

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