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sábado, 11 de outubro de 2014

Escombros da casa do pai de Lampião José Ferreira da Silva.


Ruínas da casa do pai de Virgolino

Escombros da casa do pai de Lampião José Ferreira da Silva. 

Hoje caída, sendo levada pelos visitantes, as telhas, restando só o local. 

Casa da avó de Virgolino Ferreira da Silva

É bom lembrar que Virgolino Ferreira da Silva assim como os irmãos nasceram no Sítio Passagem das Pedras, na casa da sua avó materna, 

Dona Jacosa Vieira do Nascimento

dona Jacosa Vieira do Nascimento, do outro lado do Riacho de São Domingos, região da Serra Vermelha, município de Vila Bela, hoje Serra Talhada-Pe.

Dona Jacosa fez o parto da mãe de Virgolino, e de todos os irmãos, teve grande afeto pelo neto Virgolino, ficando com ele até seus doze anos. 

 Virgolino Ferreira da Silva aos 10 e 20 anos

Fonte: facebook

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O CABO GRILO ENTERROU OS CANGACEIROS E DEPOIS DESENTERROU-OS


O policial Germiniano Luiz Sarmento (Cabo Grilo), fazia parte da volante que invadiu Angico, resultando na morte de Lampião, Maria Bonita, nove cangaceiros e o soldado Adrião Pedro da Silva.

Soldado Adrião Pedro da Silva

Depois da chacina, Cabo Grilo foi enterrar os corpos, já em grande estado de decomposição avançado.

Coronel José Lucena

O coronel José Lucena, do Estado de Alagoas, inimigo ferrenho de Lampião, o mandou desenterrá-los. Depois, ele (Cabo Grilo) foi ao Angico, e desenterrou os corpos. Muitos velhinhos da época aproveitaram a idade e mentiram como participaram de alguns episódios.

"Eu cheguei depois das mortes (Lampião...). Eu fui enterrar os corpos uns quatro dias depois. Os corpos podres, fedendo feito á porra. Quatorze dias depois, fui desenterrar novamente... (por ordem do tenente  José Lucena )..."

Cabo Grilo morreu no dia 20 de Abril de 2010, em sua localidade Entre Montes, no Estado de Alagoas. 

Fonte: facebook

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LAMPIÃO DANDO ORDEM EM LIMOEIRO DO NORTE - CE


"Se faltar um tostão, eu mato os dois". 

Lampião disse isso quando contava o dinheiro do resgate do fazendeiro Manoel Freire, da fazenda Jucuri, município de Limoeiro  do Norte, no Estado do Ceará, no dia 14 de Julho de 1927.

O rei Lampião disse isso ao irmão do fazendeiro João Freire, que chegou com o dinheiro do resgate, que foi buscar em Mossoró com o outro irmão Francisco Clemente Freire. Francisco Clemente procurou o prefeito de Mossoró para adquirir o valor de 10$000(dez contos de reis).

Fonte: facebook
Página: Virgulino Ferreira DA Silva

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MUSEU DO SERTÃO EM MOSSORÓ-RN


No dia 1º de Novembro de 2014, o  Museu do Sertão em Mossoró, abrirá suas portas para visitas, a partir das 7:00 horas da manhã, estendendo-se até às 12:00 horas do dia. 

 http://petcis-uern.blogspot.com.br/2013/03/visita-dos-petianos-ao-museu-do-sertao_26.html

Bulandeira de engenho - desimbloglio.blogspot.com


jaldesmar-costa.blogspot.com  - - Foto: Jaldesmar Costa

Você já é um convidado para visitar o Museu do Sertão em Mossoró, no dia 1º de Novembro de 2014. 

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UM FORTE CONCORRENTE DE LAMPIÃO: O BANCO FEDERAL BRASILEIRO


“DIÁRIO DA MANHÔ - 29/11/1929  
LAMPIÃO!


Esta a terrível verdade! O famigerado bandoleiro, que tem dizimado impune e impiedosamente as populações nordestinas, trouxe de novo ao nosso Estado a sua indesejável visita!

Ei-lo entre nós, de cidade em cidade, dilapidando, extorquindo, valores e dinheiros, que vão ter assim nefanda aplicação!

Acautelai-vos, sergipanos!

A menor prudência aconselha que não continueis a guardar em casa as vossas reservas.

Lembrai-vos que o Banco Federal Brasileiro dá aos seus depositantes de prazo fixo os juros de 9% ao ano e o decuplo do capital depositado se a sorte grande da Espanha couber ao bilhete número 59835, que a sua gerência já adquiriu para ser distribuído entre eles.

É preferível tentar a sorte, na grande Loteria, a deixar às garras aduncas do célebre bandoleiro, reservas acumuladas com tanto esforço e carinho.

Fonte: facebook

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Regras básicas para se pesquisar:


1 - Nem tudo está documentado oficialmente, tenha tato e analise os depoimentos orais e escritos (cruze informações).

2 - Não se envolva emocionalmente, isso acaba atrapalhando sua opinião final.

3 - Duvide de tudo e de todos, vá fundo nos documentos e não tenha medo do que está lapidado por dezenas de livros e décadas d estudo, teorias podem cair.

4 - Nem tudo que parece ser é. Cuidado com os "hoaxes" tão presentes hoje em dia na Internet.

5 - Saia um pouco do Google. Nem tudo está digitalizado e também existem muitos erros na Internet.

6 - Saiba entrar e sair dos lugares quando for pesquisar. Seja uma pessoa atenta, educada e sempre dê satisfação a todos ao seu redor.

7 - Não guarde em gavetas suas pesquisas. Vá soltando aos poucos em blogs ou redes sociais: uma foto, um texto, um detalhe... Só assim outras pessoas possam se motivar e te ajudar ou começarem a pesquisar também. 

8 - Foque na publicação de um livro ou revista. O material impresso, por mais que pareça antiquado ainda é de longe a melhor forma de se preservar uma pesquisa.

9 - Seja forte para suportar Críticas. Nem todo mundo vai concordar com você, mesmo que você esteja coberto de razão, o que se deve fazer é sempre ter calma e nunca atacar de frente sem mostrar argumentos fortes.

10 - Por último, não seja esnobe, sempre vai ter alguém mais capaz que você!

Fonte principal: Revista OMNIA
Fonte: facebook 
Autor: Robério Santos

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“DIÁRIO DA MANHÔ - 23/04/1929 AS PROEZAS DE LAMPIÃO HÓSPEDE NA CASA DE UM DELEGADO DE POLÍCIA


Aracaju, 19 (A.B.) O jornal denominado “O Paulistano”, que se edita na cidade de S. Paulo, publicou curiosa entrevista com o Sr. Alexandre Barreto, suplente de juiz municipal daquele termo, sob a recente invasão do território sergipano pelo bando de Lampião.

Segundo as informações do Sr. Barreto, os bandidos marcharam até o povoado Carira. Ali, Lampião e os seis cangaceiros que o acompanhavam foram hospedar-se na casa do próprio delegado de polícia. Havia em Carira um destacamento policial composto de seis praças. Essa força da milícia estadual em nem um momento pensou em causar o menor incômodo aos bandoleiros. Ao contrário, quatro soldados abandonaram apavorados a localidade, quando dela se aproximava Lampião, ficando apenas dois a guarnecer o quartel. Esses dois soldados restantes receberam de boa mente bebidas e charutos oferecidos pelos bandidos.


Lampião foi pessoalmente ao quartel da força de polícia, e lá fez amistosos elogios aos dois policiais que permaneceram nos seus postos... Entremente Lampião explicava que o seu desejo era conhecer todo o Estado de Sergipe.

Outras notas curiosas foram fornecidas ao “Paulistano”, pelo Sr. Alexandre Barreto. Assim, durante a visita de Lampião a Carira, o povo em geral o acompanhava a qualquer local onde se dirigia o famoso salteador.

Comentando o fato, o “Diário da Manhã”, desta capital, diz que quem leu a entrevista do Sr. Barreto notou o tom de cordialidade e intimidade que envolveu a visita de Lampião a Carira, não tendo mesmo faltado o respeito ao princípio de hospitalidade...

(Do serviço telegráfico da Agência Brasileira, divulgado nos jornais do Rio).

Fonte: facebook

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O Contestado Por: Marco Antônio Barbosa

Combatentes do Contestado

Quando surge o debate sobre qual teria sido o maior levante popular envolvendo posse de terra no século XX no Brasil, nem sempre surge à lembrança a Guerra do Contestado, que se desenrolou nos estados do Paraná e Santa Catarina entre 1912 e 1916. Culminação de um longo período de disputas territoriais entre os dois estados (cuja fronteira era contestada desde 1900, daí o nome do conflito), a guerra contrapôs a população cabocla da região e as forças militares estaduais e federais. Num movimento que unia reivindicações territoriais sobre uma área rica em madeira e erva-mate a uma revolta antifederalista, a população se organizou numa milícia que ficou conhecida como Exército Encantado de São Sebastião – indicativo de uma inspiração messiânica, não muito distante daquela que moveu os rebeldes de Canudos, no século anterior. Disposto a eliminar as insurreições regionais contra a ainda jovem República brasileira, o presidente Hermes da Fonseca acirrou a intervenção militar em 1914, chegando a enviar 8 mil soldados contra os rebeldes (que somaram 10 mil, no auge da mobilização). Os quase quatro anos de batalhas resultaram em cerca de 20 mil mortes e tiveram como conclusão a delimitação oficial da fronteira entre Paraná e Santa Catarina, ratificada em 20 de outubro de 1916.


A Guerra do Contestado é um assunto muito caro ao cineasta Sylvio Back. Natural de Santa Catarina, o diretor cresceu ouvindo as histórias dos combates. O longa-metragem que projetou seu nome internacionalmente, A guerra dos pelados (1970), era uma versão ficcional dos eventos de 1912-1916, filmado em locações autênticas em Santa Catarina. Hoje, consolidado como um dos mais importantes documentaristas da história do nosso cinema, com 34 filmes entre longas, curtas e médias-metragens, Back retorna ao conflito com O Contestado – Restos mortais, que estreou em outubro. O filme é definido pelo autor como um “docudrama”, misturando ficção e levantamento factual. Aborda o ângulo místico da guerra (incluindo depoimentos de médiuns que falam em nome do espírito de testemunhas do conflito) e recupera histórias e memórias que ainda sobrevivem no coração do Sul do Brasil. Com isso, Back espera reavivar a memória nacional sobre o Contestado, um episódio pouco lembrado até mesmo no meio acadêmico. “Foram milhares de mortos em quatro anos de embates, mas aquela tragédia persiste como um ‘acontecimento zumbi’ na formação territorial brasileira”, aponta o cineasta.

Jagunços perfilados para fotografia

Como resumir, para o brasileiro do século XXI, o que foi a Guerra do Contestado?

A Guerra do Contestado é o maior, mais violento e trágico levante popular pela posse e contra a usurpação da terra no século XX no Brasil. Começou em 22 de outubro de 1912, por causa de histórica disputa de fronteiras entre Paraná e Santa Catarina – que remontava ao Império – e acabou numa impensável guerra civil nos sertões catarinenses. Provocou a morte de mais de 20 mil pessoas, entre civis e militares, e, ao mesmo tempo, nela vieram à tona formidável surto de fanatismo religioso, com nítido substrato terrorista, xenofobia, veleidades separatistas, entrada do capitalismo na região, anti-impelialismo e uma forte ânsia de poder entre os revoltosos. Ainda assim, com a repressão de mais de um terço do efetivo do exército brasileiro à época (8 mil homens), combatendo numa área do tamanho do estado de Alagoas, a Guerra do Contestado continua pouco estudada e re-conhecida nas escolas e universidades, quase inteiramente desterrada da historiografia e do inconsciente coletivo nacionais.


Qual a importância do conflito para a história daqueles anos formativos da 
República brasileira?

Chegamos ao centenário da Guerra do Contestado e, quando penso no conflito, uma sensação de lesa-pátria nunca deixa de me assombrar, não apenas como cidadão catarinense, com vasta vivência no Paraná, mas também como um cineasta cuja obra é seduzida pela ânsia de reverter falácias, distorções e esquecimentos da “história oficial”. Quando a guerra eclodiu, na falta de melhor entendimento e até pela proximidade histórica, logo se alcunhou o Contestado de “Canudos do Sul”.  E há semelhanças, principalmente, na crença da chegada de um messias, no fanatismo dos revoltosos e na feroz repressão militar. Mas seu espectro místico, bélico, geopolítico, sócio-econômico e demográfico extravasa em envergadura, recorrência e reflexos nas décadas seguintes a trágica epopeia de Antônio Conselheiro. O Contestado que persegue uma modernidade a toda prova, justamente, por tratar da irresolvida questão da terra no Brasil, um “perrengue” sócio-econômico que prevalece desde o descobrimento, portanto, há 512 anos!


Pode detalhar um pouco como foi sua abordagem dos vários temas que 
permeavam o conflito?

A complexidade da Guerra do Contestado é estonteante, perturbadora. Talvez resida aí a ignorância sobre o conflito, que não se resume a uma luta entre deserdados da terra e as tropas do exército brasileiro armado até os dentes – usaram até canhões Krupp empregados na Primeira Guerra Mundial. Todo processo civilizatório embute barbárie. No Contestado não foi diferente. Seu caótico conteúdo era separatista e incluía a ideia da fundação de uma “monarquia sul-brasileira”, que se estenderia do Uruguai ao Rio de Janeiro. Ainda havia a influência multinacional, com a chegada do capitalismo na região; um componente xenófobo, com a entrada dos imigrantes europeus confrontados a caboclos, negros e índios; e a exploração de empresas estrangeiras aliadas a latifundiários, mercenários e aos detentores do poder político e militar no Paraná e Santa Catarina.

Marco Antônio Barbosa

FONTE:http://www2.uol.com.br/historiaviva/artigos/contestado_uma_guerra_civil_no_sertao_catarinense.html

Veja mais sobre a Guerra do Contestado em:
http://cpdoc.fgv.br/contestado

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O casamento de Licor (prima de Lampião)

Por Raul Meneleu Mascarenhas

As estórias sobre Lampião são muitas. Uma das mais interessantes que achei - acho que todas são interessantes - foi a contada por Frederico Bezerra Maciel. um pernambucano da "molesta" que foi a festa de casamento de uma prima legítima de Lampião.


Como excelente contador da história de Lampião era também um grande estudioso sobre diversos assuntos aja visto que era um poliglota com estudos e formação em diversas áreas das ciências humanas. Só pra vocês terem uma ideia quem era o "home" vou citar sua sabedoria que primeiro foi um dom de Deus dado a ele desde menino, sua inteligência fora do comum.


Nasceu em 1912. Era Padre ( Sacerdote), com estudos eclesiásticos em São Paulo, Rio de Janeiro e Olinda, especializados na Europa (Universidade Gregoriana de Roma; França; Suíça; sociologia, parapsicologia, psicoterapia, arte, estudos bíblicos...) e, por último, Técnico Agrícola em Pernambuco. Além disso, poeta, compositor musical, desenhista mormente arquitetônico e homem de ação e atuação social. Pois bem, foi ele quem escreveu um dos melhores relatos sobre o cangaceiro, quando escreveu "Lampião, Seu Tempo e Seu Reinado" são 6 volumes pra o leitor ter uma melhor (e grande) ideia o que era o fenômeno Lampião.

Pois bem, então vamos ao acontecido:

O casamento de Licor (prima de Lampião)

No arruado de Nazaré nos indos de 1923, era o cochicho entre os moradores, esse casamento e a vinda de Lampião para assistir esse evento. Contava Nazaré com uma capela, vinte e sete edificações ( casas, casebres e quartos) alinhadas em uma única rua, sendo doze do lado do riacho Ipueiras, dez no riacho Carqueja e cinco ao sul, de frente para a capela. Era assunto palpitante e preocupante.

Como em todo lugar que junte gente, tinha ali naquela pequena povoação o ponto certo pra se ouvir as "urtimas" e esse é claro, era a barbearia de Manuel Flor que segundo o Padre Frederico, era o local onde "aviciados em conversas de toda versidade" reuniam-se para "sortar as premeras do dia".

- "Tem muita volante esgravetando esse sertão brabo na persiga de Lampião!"

E citavam seus comandantes, homens de têmpera de aço, a perseguir o famoso cangaceiro e seu bando.

- "Mas Lampião diz que gosta que persigam ele e açula pra briga de vera. O cabra é da peste!"

- "Nunca mais fartou volante aqui. É uma atrás da outra."

- "Inté se espera uma no casamento de Licô."

- E Lampião num vem mermo pru casamento da prima!"

- "Danega! Já tou vendo: vai ser bala quiném os trinta!"

Rapazes e meninotes não davam palpite. Apenas ouviam, aperuando.

Depois do banho de cuia no fim das lidas do dia, cheirando a folha de mato novo, ao mesmo tempo mesmo tempo que preparavam a ceia de coalhada adoçada com rapadura raspada, pão de milho e café, três cabrochas bisbilhoteiras tagarelavam:

— "Visse o vestido de Licô como está dolero?
— "Os apreparo da festa são grande mesmo!"
— "Pie só: sabe quem vem pra festa?
— "Lampião!"
— "Ele e os menino. Tem cada um da pontinha!..."
— "Eu acho Juriti e Antônio Rosa os mais bonito".
— "Dextá, o mais bonito é Lampião!"
— "Ah! isso é", — confirmaram as outras duas a uma só voz.
— "Açoita os mais todos!"

Sá Leopoldina, cabocla escura e franzina, a cabeça enrolada com um regô, dona do único hotel local, resumido a uma latada, coberta de mato, em frente do chalezinho de taipa onde vivia. Servindo almoço a dois fregueses de passagem para o vilarejo de Santa Maria, comentava se rindo toda:

— "Lampião tem o coração muito bom para as fraqueza dos pobre. Inté ajuda com dinheiro e de-comer. Toda a vez que aparece pruraqui, compra muito pano nas loja de seu Zé Tiburtino, de seu Quinca e de seu Gominho e dá a pobreza. As irmãs de Mané Neto recebero bastante vestido".

Enquanto eram fritados os mandins que pescara num poço do riacho Ipueiras e aguardava os aficionados do jogo de que era aviciado, Raimundo do Pico, sentado num tamborete na calçada de sua casa e muito ancho na sua sanfona de oito baixos, tocava "Mulher Rendeira", dizendo para os passantes: — "Gosto dela! Foi Lampião que fez os verso e a musga se alembrando de sua avó, a Tia Jacosa, que criou ele e era rendeira. ."
O casamento de Licor foi o momento culminante do rompimento definitivo, que aos poucos vinha se processando, em desde 1919, através de tranças e atritos frequentes, entre os Ferreiras e nazarenos.

Maria Licor Ferreira de Lima, simplesmente Licor, era prima legítima de Lampião, cujas mães eram irmãs. Sabedor de seu casamento, chegou Lampião no dia marcado para sua realização, a 31 de julho de 1923. Ao sol ardente e faiscante do meio dia, penetraram, inesperadamente, na povoação, dezesseis cangaceiros na ativa, sob o comando de seu garboso e elegante chefe, Lampião.

Além de seus irmãos Antônio e Livino, tinha Meia Noite, Juriti e seu irmão Batista, Manuel Tubiba, Chá Preto, o corneteiro Firmo, Caixa de Fósforo, Piloto... Antes, arredadas duas léguas para trás, deixara estrategicamente Lampião, perto da serra do Pico, na fazenda Enforcado, de seu amigo Pedro de Engrácia, um grupo tático de reserva: oito cangaceiros sob o mando de um cabra macho, Antônio Rosa.

Entre as armas, portavam os cangaceiros rifles papo amarelo e cruzeta, exceção de Lampião e de Chá Preto que conduziam mosquetões. Traziam, também, alguns chicotes de fio cortado da linha telegráfica.

Postadas sentinelas em cada esquina da rua, espalharam-se os demais pelas casas, indo logo beber truaca e zinebra "Gato" nas vendas de João Ferreira e Enoque de Sá Menezes. Surpreendida, assustou-se a população. De logo correram boatos: que Lampião tinha vindo para ajustar contas... tirar forra de questões passadas... aquelas Peias eram para dar pisas...

O povo todo sabia que não era coisa do gosto de Lampião aquele casamento de sua prima com Enoque, um sujeito calabar, suspeito de informante à polícia dos movimentos do seu grupo. O destacamento policial local, de seis praças sob o comando do cabo João Cabecinha, cujo quartel era a casa-da-rua cedida por seu dono, Gomes, havia sido retirado pelo delegado de Floresta.

Certo de mesmo, a propalada vinda de forças volantes para aqueles dias.
Cerca das duas da tarde. Pela estrada, vindo de Vila Bela, chegara, com seis horas de viagem, o vigário da freguezia, Padre José Kehrle, ou somente Padre José, mais por simplificação do falar do que pela dificuldade da pronúncia do sobrenome alemão.

Montava a cavalo, guarda-pó branco revestindo-lhe a batina preta e grande chapéu de palha na cabeça e ensombrando-lhe o rosto vermelhão, onde pespegadas as duas bolas azuis de seus olhos buliçosos e vivos.

Lampião tocando na sanfona de Raimundo do Pico, debaixo da latada da feira no meio da rua. Os cabras por todos os lados. Com a chegada de seu vigário, os cangaceiros, nos seus alegramentos, soltaram foguetes, salvando seu estimado amigo e conselheiro. Com os papocos, o animal espantou-se muito, quase Derrubando o reverendo cavaleiro no chão.

Um dos cabras, porém, dominou a montada, segurando fortemente as rédeas abaixo da brida. Os outros se aproximaram, e pedindo a bença beijavam a mão do padre, que os abençoava e retribuía os cumprimentos, satisfeito e agradecido.

Costumava o bom vigário, nas desobrigas mensais em Nazaré, hospedar-se na casa de Antônio Gomes Jurubeba, ou simplesmente Gomes. Mas, este, logo da chegada dos cangaceiros, fugiu para sua fazenda, deixando a casa trancada. Ficou assim desarvorado o vigário, no meio da rua, por um momento sem a ter para onde ir. Não teve dúvidas João Ferreira, acolhendo-o, imediatamente e de muito gosto, em sua residência. atitude insólita de Gomes, taxada de "ignorância", porque não tirava as coisas por menos, e censurada até por amigos e parentes como "afrontosa" ao padre, acirrou ainda mais os ânimos desconfiados, arredios, prevenidos e recalcados de toda 'aquela gente. Aceso assim o estopim de uma explosão preparada e prestes a rebentar em consequências irreversíveis.
Confiado no apoio e no respeito que o vigário imprimia com sua presença na terra, Alfredo Ferreira de Lima, irmão da noiva, sentindo o ambiente tenso reinante, fora ter com Lampião, fazendo-lhe ver que não ficava bem, num dia de festa como aquele, a sua vinda com o bando assim solto, acintosamente armado, e, às bicadas em desde que chegaram.

Meio agastado, Lampião olhou-o a fito com olhar desafiador e o dedo nas fuças do primo:

— "Deixe de bestage! Eu sóstou você acolhendo bandido de gravata, bandido encapado..." Referia-se a certas autoridades que faziam muito pior do que os cangaceiros.

E, ainda puando: — "Nós também somos gente, podemos participar da festa". Nesse momento oportuno apareceu um homem de muito preceito e respeitado, Cândido Ferreira que, auxiliado pelo Padre José, pôs termo àquela discussão e convidou Lampião a ir à sua casa.

Na residência de Cândido começou Lampião a puxar o fole. Os cabras dançando com as moças... muita alegria... Cândido, de sobrosso, reclamou essa dança a modo de não se comprometer depois com as autoridades embuanceiras. Lampião, compreensivo e sem dizer nada, guardou a sanfona. Porém, seu irmão Livino, enticado com a atitude do tio estragando aquela gostosa e singela brincadeira, ficou com a goitana e disgranido ameaçou: — "Pois aqui ninguém dança mais, senão tudo se acabal..." Deu de mão de sua mausa e levantando-a para o alto, sortiu a sala com gritos repetidos: "... se acaba Nazaré!" E mais: — "Não tou esquecido da cicatriz no ombro! Quero todos os rifles de todo mundo agora, aqui, senão boto fogo nas propriedades".

Foi um tendéu danado... Padre José conseguiu a custo amoitar o ânimo exaltado dele, sob promessa de que não haveria dança. E aproveitou o ensejo para mandar os noivos se aprontarem logo.

Esperava Livino pelo tocador, Luís, de Andréza, gente de Zé Saturnino, contratado para a festa dos noivos. — "Quero dar uma pisa nele e rasgar a harmônica". Mas o tocador, sabendo em caminho, da presença de Lampião, no casamento, deixara-se, escabreado, ficar na fazenda Zé Dias, de Chico Flor, onde estava homiziado Luís Soriano, e dali mesmo se esgueirou, sumindo-se, que não era besta, não.

O cortejo

Às quatro horas da tarde, saiu o préstito nupcial para a igrejola, com muitos convidados fazendo par, braço dado, exibindo-a lordeza matuta e ladeados de alguns cangaceiros, respeitosos, chapéus na mão.

Nessa ocasião apareceu Davi Jurubeba com estranha idéia, que depois se deu o nome, mais estranho ainda, de "conspiração". Vendo os nazarenos perdidos, Davi teve a idéia de convidar Manuel e Euclides Flor para escolherem tantos nazarenos quantos dessem para cada um se encarregar de matar um cangaceiro. Os cangaceiros não estavam juntos, mas espalhados pelas casas de Cândido Ferreira, D. Joaninha Ferreira, João Ferreira, Anízia da Ipueira... o que facilitaria o "serviço". Essa "opinião de doído" teve imediata repulsa de João Flor: — ".É, vocês faz isto e eu vou morrer?» Significando que não dava certo e temia por sua sorte.

A noiva, como sempre, objeto máximo das atenções. Vestida de branco vuale suíço, comprido véu descendo da grinalda — um primor de capela com arranjos de flores de laranjeira de seda branca e botões de goma —, enfim toda linda, distribuindo sorrisos, uma graça de brejeirice... Na passagem do acompanhamento por frente da casa de Cândido, os que estavam sentados em cadeiras na calçada se levantaram, mas Antônio Ferreira ostensivamente virou as costas. Além de não simpatizar com o noivo, suspeito de falso e denunciante, curtia ele paixão arrecolhida, de penar e de tristeza, pela noiva, com quem, outrora, antes do cangaço, apiançava casar-se.

Após o casamento, a fim de desanuviar o ambiente, combinaram os parentes da noiva botar mesa, na casa dela própria, onde os cangaceiros, de apetite aceso, se serviriam juntamente com o Padre José. Durante a janta, tendo Lampião sentado a seu lado, o Padre José, que lhe tinha amizade e muito o admirava, persistente aconselhava: — "Deixe essa vida. Você não é para estar nesse bando. Você .não é ovelha negra, desgarrada..." — "Num tem jeito, não — respondia Lampião. Num quiseram assim? Mataram meus pais. Desmantelaram minha família e negócios. Querem me matar também. Vou até o fim... Ë o meu destino!"

A contrafesta

Terminada a janta, que foi lauta e de tudo o que o prato sertanejo dispõe, aos insistentes pedidos de seus tios Cândido e João, e de sua tia D. Joaninha, foi Lampião, com os seus, fazer arranchação na fazenda do velho preto Antônio do Campo Alegre, obra de menos de quinhentas braças do povoado, do outro lado do Ipueiras.

O bando passou a noite na casa de Sebastião Eusébio onde Livino, ferido, se refugiara, em 1919. À luz amarelenta e vacilante de cuviteiros fumacentos, uns Jogando bozó, outros dançando com cabrochas vindas da rua, outros versejando cantigas no improviso, a sanfona sempre roncando...

Aproveitando a ida de Lampião com seu grupo para Campo Alegre, saíram os nazarenos, nas caladas da noite, para se armarem. Entre eles, Davi Jurubeba, Manuel e Euclides Flor, Gomes Jurubeba, Manuel e Pedro Gomes... aos quais se juntaram Mais outros, ao amanhecer, num total de quinze. Intencionavam cedinho ocupar a 'dia e esperar pelos cangaceiros, mas acharam que eles, os nazarenos, eram "poucos".

Aos acordes animantes da "Mulher Rendeira", foi repisada com ovações a quadra sarcástica:

 "Os cabras de Nazaré
        Chorava que faz horror
             Com pena das muié
                 Que Lampião carregou".

O vilarejo, porém, afogado dentro duma noite desalegrada e de cruviana... Nenhum pé de pessoa na rua. Apenas o grugunhado de gente na casa da noiva, sob a luz dos pavios espevitados das placas.

O Carreiro de Santiago luminando lá na escurideza do infinito...
Cantos de galos tristes rasgando pela madrugada o silêncio da natureza...
No oco de um pau seco, caburés, frientos e arrepiados, piando, agoirentos... De vez em vez, e isto até o quebrar da barra, em revezo contínuo, chegava a Nazaré um cangaceiro.
Encontrando-se com dois deles, perguntou Cândido:

— "Que é que vocês estão fazendo aqui?"
— "A gente — repostou um deles — está jogando lá, e passa uma pessoa e diz: — "Vamos pra rua?" e a gente vai..." Mentira, a modo de ocultar que estavam boscando, inteirando se havia dança.

A Missa

Quando foi o rasgar do dia seguinte, 1° de agosto, chegaram mais dois cangaceiros na rua e foram logo se justificando diante de Cândido, atento a seus movimentos:

— "Passemos a noite inteira sonhando uma voz que mandava a gente ir pra Missa. A gente, também, é cristão, ninguém é cão, não".

A pouco e pouco os outros foram chegando até se completarem os dezesseis.
Da calçada da capela, adonde desarriaram o equipamento, ensarilhando as armas, em cujo entrançamento das bocas se dependuravam as cartucheiras, deitados no chão os bornais refertos e cobertos pelos chapéus de couro, os dezesseis assistiam, com toda a fé e respeito, à Missa, que foi cedo, às 7,00; porque seu vigário estava vexado, tinha de ir logo simbora. A pequena igreja estava dura de gente atochada. Gente do arruado e de toda a redondeza. O canto do Oficio da Imaculada Conceição se arrastava, dominantemente por vozes femininas, quiném querendo não chegar ao fim, numa latomia dolente característica da sofrida alma sertaneja:

— "Dai pressa Senhora
           Em favor do mundo,
                Pois vos reconhece
                     Como defensora".

Para sua breve prática, o padre tomou por tema o profeta Jeremias (17,8): — "O coração do homem é dissimulado e perverso". Depois da Missa, os cangaceiros retomaram o equipamento. maioria saiu para fazer restos de compras. — "Tudo correu bem, na santa paz, graças a Deus!" — dizia o vigário, a satisfação sublinhada nas faces cheias com um sorriso.

O segundo fogo
Lampião, com alguns, apenas aguardava, antes de partir, que o padre terminasse uns batizados a fim de se despedir e receber a bença dele. Nesse quando, coincidiu ser Lampião informado pelas sentinelas e ouvir, ao mesmo tempo, de alguém se aproximando:

— "Vigie! Que cumandita de gente, lá longe, na estrada! Será que vêm pra feira?"

Lampião, de detrás da casa de João Ferreira, mão em pala sobre a testa, buscando acomodar a vista, exclamou alteando as sobrancelhas.
— "É macaco!"

A disgraceira estava feita!

Nunca houve tanta gritaiage e correria do povo, que se esbandaiava por todos os lados, doidamente... Lampião, agindo com rapidez e eficiência, sempre se revelando autêntico comandante inteligente e seguro, imprimindo assim confiança aos seus, imediatamente apitou chamando seu pessoal.

Antônio Ferreira, com outros, estava na barbearia cortando o cabelo e fazendo a barba. Ajuntou, em menos de um sufragante, os homens diante de Lampião, que, calmo e firme, tracejou, com técnica, o cinturão defensivo, estabelecendo os pontos de operação fora da rua e dentro das casas e muros, distribuindo os piquetes de defesa, instruindo para não se perder munição à toa, sem objetivo.

Depois, pegou de um cavalo pombo-seleiro, ali amarrado no pé da quixabeira plantada mesmo defronte da casa de João Ferreira e pertencente a um amigo, e enviou nele um positivo, que num átimo avoou o corpo em cima da sela, para ver Antônio Rosa, no Enforcado, com instrução de dar uma retaguarda, para o que deveria tomar o caminho do outro lado, descendo pela margem direita do riacho da Ema.

De suas posições de combate dentro dos muros das casas, os cangaceiros furavam buracos enviezados na parede, formando assim "torneiras", onde enfiavam o cano dos rifles para atirar.

Livino Ferreira, esse esconjurado do medo, entrincheirou-se na casa de D. Anízia, mesmo em cima do fogo! A volante de mais de trinta praças, sob o comando do sargento Bento Senhorzinho Alencar, vinda em diligência da zona de Pajeú, fora notada logo ao irromper, em fila indiana, a sudoeste.

Ao topar com o riacho Carqueja, parte da soldadesca foi logo se entrincheirando ao longo das ribanceiras barrentas; outra parte vadeiou o leito seco e arenoso do mesmo riacho tomando posição de ataque pelo lado sul, agachando-se por trás da amontoeira de pedra do pequeno serrote que mirava de soslaio; a entrada da rua.

O cabo Manuel Amaro, nutrido na peba* e no gosto de contar pabulagem, temeramente se achegou mais para frente dessa linha de ataque, amalocando-se atrás de uma grande pedra arredondada.

* Cachaça. A denominada "peba" ou "rinchona" é fabricada no sertão e nos agrestes por processo sintético: mistura de álcool, açúcar preto e água. O açúcar preto era o de torrão, de forma, de bangué, o chamado pão-de-açúcar. Em sua substituição. usava-se o açúcar sumeno, mascavo ou demerara, cristalizado e de cor amarelo-queimado. O preparo dessa cachaça se faz em tachos. É, portanto, urna aguardente ordinária, ou cachaça. Um de seus sinônimos: "lasca-peito". Na zona canavieira da "Mata" ou do "Sul", a aguardente é extraída da cana-de,' açúcar ou do mel de cabaú, melaço ou mel de furo (escorrido do açúcar preto por, um furo no depósito). destilada em alambique (raro o de barro). A primeira destilada chama-se aguardente "de cabeça" a média, aguardente "boa"; a terceira, restante, fraca de teor alcoólico, mais água que álcool, denomina-se "caxixi".

Por volta das nove horas, rompeu o tiroteio e prosseguiu, cerrado e violento, trancando o mundo... Bonito que fazia gosto a fuzilaria seca no estrondo dos mosquetões e os estampidos fofos dos rifles! Vez por outra parava. Parecia que tinha acabado. As mu-lheres, dentro de casa suspiravam de alívio. Mas, era só um arejo de momentos, nas mudanças dos combatentes para melhores posições. Em seguida, recomeçava intenso, danasco, em rajadas tatalantes, debaixo de palavrões e insultos, o sangue cada vez mais esquentando.

Partido do meio da rua, ouvia-se o toque guerreiro da "Mulher Rendeira". Era Lampião, nos intervalos em que dirigia a luta e atirava também, com sua sanfona animando os cabras. Os nazarenos, conluiados por João Flor, aproveitaram a oportunidade para se levantarem em armas contra Lampião. Lá para as dez horas, articularam-se com a polícia, entrincheirando-se por trás da cerca de pau-a-pique do cercado da fazenda Campo Alegre, do lado de cá do Ipueiras.

Eram uns quinze homens armados, entre os quais João Flor com seus filhos Euclides e Manuel, os dois irmãos João Domingos e Luís Soriano, Pedro Gomes que portava pistola máuser FN, dois rapazes de fora e Gomes Jurubeba com o pessoal que trouxera para isto de sua fazenda Jenipapo.

Davi Jurubeba, que viera de mãos abanando, armou-se com o fuzil de Zé Preto, o único "aspençada" da volante. Este, chega ia que ia, todo entusiasmado, se protegendo por trás de uma quixabeira.

Divulgando-o, Lampião avisou a Chá Preto que combatia de dentro da barbearia. Atirando de ponto, com seguridade, Chá Preto gritou: — "Lá vai macaco da gota!" Atingindo-o no braço e avoando-o contrafeito de dor, fora de combate. O cangaceiro largou desadorada risadona de mangação. A polícia e os paisanos estabeleceram verdadeiro bolsão ou semicerco ao tomarem posições no flanco sul e parte do Poente e em toda a linha do flanco nascente.

Na Igreja

Desde o início do tumulto provocado pelo alarme, o padre José mandou fechar imediatamente as portas da capela pelo sacristão, Zé Rufino, o qual em seguida escapuliu, fugindo montado num cavalo em osso, em disparada louca, numa toada só, até esbarrar, cinco léguas adiante, na fazenda São Miguel.

O padre amparou-se na parede entre as duas portas da entrada. E mandou as pessoas, que ficaram dentro, deitarem-se no chão da nave. Passou o vigário o tempo todo suando, nervoso e pálido, com o rosário na mão, rezando por suas ovelhas desavindas. Poucos balaços alcançaram as paredes externas da capela. Quase meio-dia. A luta, com bem quatro horas de duração, continuava indecisa.

Lampião falou com Cândido para abrir um buraco na parede da casa dele a modo de estabelecer uma passagem para a casa de D. Joaninha. Cândido discordou e, aperriado com a insistência do sobrinho, foi tirar o padre da capela, assim mesmo, debaixo de todo o tiroteio, e levá-lo para a casa de João Ferreira.

A retirada

Ali, na casa do irmão, com muito pedido e imploração, obteve Cândido, com a ajuda do padre, que o opinioso Lampião se decidisse retirar da localidade, principalmente em atenção a seu vigário, que não podia ficar prejudicado diante de compromissos inadiáveis em Vila Bela.

Antes, porém, de se afastar, gritou Lampião para os adversários:

— "Cambada de macaco! Covardes! Vou sair, não por covardia, mas atendendo ao pedido de meus dois grandes amigos, Padre José e tio Cândido Ferreira".

Enquanto, a um sinal seu — a pistola descarregada ininterruptamente — ia se reunindo o grupo em frente à casa de João Ferreira, coincidiu, de novo, as sentinelas lhe avisarem o irrompimento de outra força, que avançava pelo flanco norte, podendo dar ataque de retaguarda e fechar o grupo em perigosíssmo cerco.
Era uma volante de mais de trinta praças, sob o comando do sargento João Francisco, de alcunha João Fininho, vinda das bandas de Vila Bela e, como a primeira, a chamado do próprio Enoque, o noivo, em carta secreta ao então ao comandante da polícia, ten.-cel. João Nunes.

Lampião compreendendo as posições inimigas, agora envolventes, com superioridade numérica e bélica, e temendo o esgotarnento de sua munição, ordenou impetuosa esfuziada, modo de, atarantando o inimigo e aproveitando o fumaceiro, - a retirada ficar facilitada e garantida.

"Cumpadre, foi tanto papoco no oco do mundo que -nunca vi! — o panavueiro cobriu tudo! Maldei que tinha chega o fim do mundo!..."

Pelo caminho, à tangente, lançado do oitão direito da capela, os cabras, todos ilesos, se retiraram, aos xingos e pilhérias, agachando-se e rebolando, correndo e sempre atirando.

Cruzaram o valado seco do riacho, subiram pela margem direita, mais adiante se encontrando com o grupo de Antônio Rosa, vindo à toda para o contra-ataque. Mas era tarde. Empalhara-se ele com a aproximação da segunda volante, que o aturdira, ficando sem saber que rumo tomar. E embrenharam-se todos os cangaceiros na caatinga...
A danação
Terminado o tiroteio de mais de três horas, os atacantes, desconfiados de alguma das indecifráveis ciladas do astucioso Lampião, demoraram bem meia hora para penetrar na rua, assim mesmo cautelosamente. Mas, quando entraram, deu de súbito uma doideira dos diabos naquela soldadesca, que começaram a lançar, assim na doida, disparate de balas nas paredes, portas, janelas, por toda parte, chegando mesmo os projéteis a pegar em quadros de santos pendurados nas paredes do interior de algumas casas momentaneamente abertas.

Desencadeou-se, então, novo pânico. Correrias, gritos, choros, portas e janelas aos baques se fechando outra vez. Incontinenti reclamou o Padre José ao sargento Senhorzinho aquela desordem, o qual, de pronto, ordenou que cessasse. Com mais pouco chegava a volante do sargento Fininho. A rua esborrava de soldado.
Dada por Fininho uma batida por perto, no derredor da povoação, para certeza do afastamento dos cangaceiros. Depois vieram os interrogatórios sobre quem ou não coitei-ro, as acusações fáceis, ameaças de toda sorte, ou sejam de pisa, de capar, de sangrar, de saquear, de incendiar... O terror! A vítima principal naturalmente tinha de ser a família Ferreira ali domiciliada.

Quem pôde, fugiu, no seu animal ou a pé, ou se escondeu. A situação agora pior do que a anterior, pois sob o guante da autoridade, despótica, absoluta, oficial.

E, lá vai o pobre do Padre José, pressuroso e amargurado, suando e exausto — anjo providencial da paz — defender de novo o povo e restituir-lhe a tranqüilidade.

Conformado, senão convencido, com as muitas explicações e justificativas do vigário, o sargento Senhorzinho saiu batendo naquelas portas ainda fechadas de medo:

— "Podem abrirem. Tá todo mundo agarantido".

De todo o jeito, porém, aquele povo, pobre e sacrificado, humilde e abandonado, teve de pagar, e muito caro, uma dívida estranha: almoço com bebida e tudo mais para tanto sol-dado!...

Guarnecendo o vilarejo contra uma daquelas possíveis e perigosas surtidas de Lampião, a soldadesca, refestelada e quente, de entusiasmo vibrante, cantava — coisa curiosa! — "Mulher Rendeira", como se fosse essa canção o hino comum daqueles sertões sangrentos! ...

Consumou-se nesse segundo tiroteio a intriga definitiva e gadal entre Lampião e os nazarenos.

A família Ferreira daí em diante sofreu os piores vexames, ao ponto de ter, mais tarde, de se retirar da localidade. Entretanto, essa família fora sempre a desvelada defensora e salvadora de Nazaré contra os propósitos e as investidas de Lampião. Logo nesse mesmo dia 19 de agosto, dois fatos lamentáveis:
a) O sargento Zé de Xanda, com um tiro, espatifou o grande e belo espelho de cristal da sala de visita da casa de D. Joaninha Ferreira.

b) Apareceu o tenente Senhorzinho Alencar querendo obrigar a mesma D. Joaninha a entregar os vestidos da primeira comunhão das meninas Josefa e Dulce, filhas de Antônio Matilde e que ela criava. Alegava o tenente que os vestidos pertenciam às filhas do finado Gonzaga. Exigia, também, as sapatinas e os trancelins. Chamados, à presença do tenente: o senhor João Cominho, da loja onde foi comprada a fazenda; a costureira D. Ernestina Correia Cruz; Tonheiro, o portador dos vestidos prontos; e René, outra testemunha de tudo. Genésio Ferreira, irmão da noiva Licor, procurou Davi Jurubeba Respondeu que ele obtivesse do tenente o nome da pessoa que lhe dera a informação falsa. respondeu o militar: — "De uma parenta da viúva de Gonzaga, aqui residente (e disse o nome)..."

A família Ferreira ainda hoje é muito grata a Davi Jurubeba e a Manuel Neto, os quais, apesar de inimigos figadais de Lampião e seus irmãos do cangaço, sempre respeitaram e até defenderam os outros membros da familia o seus bens. 


O PADRE JOSÉ KEHRLE


Padre José Kehrle. Nascido em 1891, em Wurttemberg, Alemanha. Veio para o Brasil em 1909. Beneditino e veterinário. Sacerdote em 1914. Como padre secular desenvolveu, no sertão, intensa atividade apostólica, além da construção e reforma de igrejas. Ocupou altos cargos e missões na diocese de Pesqueira, ao mesmo tempo que, por infeliz contraste, chega às raias do incrível o que sofreu da parte de bispos. Vigário de Vila Bela (Serra Talhada) de 1922 a 1936, conheceu e acompanhou toda a trajetória de Lampião no cangaço. Sua força moral sobre ele quase se igualava à do Padre Cícero. Porém, a esse superava no conhecimento do foro íntimo. Lampião era seu confidente. Diante do Padre Kehrle despia sua realeza cangaceiresca para se tornar simples ovelha, nem sempre dócil por motivações extrínsecas. Realmente, grande parte da vida de Lampião não pode ser escrita desligada desse virtuosissmo sacerdote, que chegou mesmo ao impossível de retirar cangaceiros do seu bando. Em 1936, no sítio Guarda, da serra de Ororubá, perto de Cimbres, município de Pesqueira, testemunhou, com sérias averiguações, as aparições de Nossa Senhora dos Graças a uma humilde camponezinha, depois freira conversa. Nessa ocasião, indignou-se contra as medidas violentas usadas pelo bispo que se valeu da polícia para acabar com aquele "fanatismo", de qualquer modo, "mesmo debaixo de pau", o que, Iamentavelmente, aconteceu àquela pobre gente que, na simplicidade de sua fé, acorria ao local. Muitos os episódios interessantíssimos em sua vida que merecia escrita para edificação espiritual, principalmente dos sacerdotes. Há anos vivia ele em Buíque (PE), carregando uma saudável velhice dentro um exuberante espírito, cada vez mais acentuando o traço predominante de sua alma — a caridade, quando a 4-8-1978 faleceu.

Pois bem, cabe a cada um ao ler sobre fatos como esse e outros para dizerem se Lampião era Herói ou Bandido. Uns chegam a dizer que ele era uma mistura dos dois adjetivos. Vemos em sua estadia no povoado de Nazaré, que ele estava ciente de sua situação, esta levada por intrigas que descambou para a violência. Lampião foi uma cria do sistema latifundiário brasileiro onde imperava o coronelismo.
 
A filha de Lampião e Maria Bonita, em exposição sobre o Cangaço no Centro de Arte e Cultura Dragão do Mar na cidade de Fortaleza capital do Ceará em entrevista diz que as pessoas precisam conhecer esse movimento que se deu na região nordeste do Brasil em que seu pai foi o maior expoente e personagem. Diz que Lampião tinha um pouco de Herói e Bandido. Abaixo alguns testemunhos para que avaliemos o que foi o Cangaço e seu principal expoente Lampião.

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