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segunda-feira, 30 de julho de 2012

ARCHIMEDES ABSOLVE LAMPIÃO (SOBRE O LIVRO LAMPIÃO CONTRA O MATA SETE)

Por: Severino Coelho Viana


O livro "LAMPIÃO CONTRA O MATA SETE", de autoria de Archimedes Marques, nós consideramos a contrariedade do libelo-acusatório ao livro "LAMPIÃO " O MATA SETE", de autoria de Pedro de Morais. Se tivéssemos a oportunidade de participar de um julgamento, fundamentado nas provas concretas constantes nos autos, nós absolveríamos o livro "LAMPIÃO CONTRA O MATA SETE", pelo o conteúdo irrefutável, e, por via de consequência, condenaríamos o livro "LAMPIÃO " O MATA SETE", que se baseou tão somente em vagos indícios orais, na visão do autor e que lhe foram revelados por fontes frágeis de uma sustentação plausível. 


O escritor Archimedes Marques usou uma linguagem corrente de fácil compreensão. Além dessa linguagem de cunho jornalístico transformou em palavras eloquentes porque soam a verdade dos fatos. Rebuscou o aprofundamento na verdade histórica com o devido cuidado de citar a fonte de onde retirou a informação. Não emitiu juízo de valor porque tinha material suficiente para provar e comprovar a sua verdade. Mostrou ser um pesquisador obstinado, um zeloso pelo manancial abundante do cangaço, e, sobretudo, um relator que usa a decência para expor o fato com a naturalidade dos acontecimentos chegando repetir a lição com o reforço da pergunta nas suas justificativas. Não se apegou a pequenez, nem distorceu o conteúdo, nem tampouco contrariou a história, simplesmente, foi verdadeiro. Por seu turno, as linhas tortuosas do livro o "LAMPIÃO " O MATA SETE", infelizmente, o autor esqueceu o rumo da história do cangaceirismo, de modo diverso, tentou contrariá-la, afastou o seu roteiro, escondeu os caminhos claros e andou pelas veredas. Trouxe um conteúdo que não interessa a ninguém, muito menos aos amantes, pesquisadores, curiosos da história do cangaço no Nordeste brasileiro. É patente a premeditação do enredo em busca do ataque. A partir do primeiro capítulo e quando chegou ao último capítulo à emissão de juízo de valor subjetivo pelo autor fluiu de forma exacerbada que faz os pelos do leitor se arrepiar a ponto do tamanho do sobressalto e cair no campo da indignação.

O nosso entendimento sobre a história do cangaço, percebemos que a sua existência verificou-se entre o final do século XIX e começo do XX quando surgiram, no Nordeste brasileiro, grupos de homens armados conhecidos como cangaceiros. Estes grupos apareceram em função, principalmente, das péssimas condições sociais da região nordestina. O latifúndio, que concentrava terra e renda nas mãos dos fazendeiros, deixava às margens da sociedade a maioria da população. Desde o século XVIII, com o deslocamento do centro dinâmico da economia para o sul do Brasil, as desigualdades sociais do Nordeste se agravaram. Entretanto, no sertão, onde predominava a pecuária, consolidou-se uma forma peculiar de relação entre grandes proprietários e seus vaqueiros. Entre eles, estabeleceram-se laços de compadrio (tornavam-se compadres), cuja base era a relação de fidelidade do vaqueiro ao fazendeiro, com este dando proteção em troca da disponibilidade daquele em defender, de armas nas mãos, os interesses do seu patrão. Os conflitos eram constantes, devido à imprecisão dos limites geográficos entre as fazendas e às rivalidades políticas, transformadas em verdadeiras guerra entre poderosas famílias. Cada uma destas fazia-se cercar de jagunços (capangas do senhor) e de cabras (trabalhadores que ajudavam na defesa ), formando verdadeiros exércitos particulares. Nos últimos anos do Império, depois da grande seca de 1877-1879, com o agravamento da miséria e da violência, começaram a surgir os primeiros bandos armados independentes do controle dos grandes fazendeiros. Por essa época ficaram famosos os bandos de Inocêncio Vermelho e de João Calangro. Contudo, somente na República o cangaço ganhou a forma conhecida, com 


Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião. Que aterrorizou o nordeste de 1920 a 1938. Havia uma razão para esse fato. Com a proclamação da República em 1889, implantou-se no Brasil o regime federalista, que concedeu uma ampla autonomia às províncias, fortalecendo as oligarquias regionais. O poder dessas oligarquias regionais de coronéis se fortaleceu ainda mais com a política dos governadores iniciada por Campos Sales (1899-1902). O poder de cada coronel era medido pelo número de aliados que tinha e pelo tamanho de seu exército particular de jagunços. Esse fenômeno era comum em todo o Brasil, mas nos estados mais pobres, como Pernambuco, Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte, os coronéis não eram suficientemente ricos e poderosos para impedir a formação de bandos armados independentes. Foi nesse ambiente que nasceu e prosperou o bando de Lampião, por volta de 1920, coincidindo o seu surgimento com a crise da República Velha. Depois da morte de Lampião, em 1938, nenhum outro bando veio ocupar.

Portanto, podemos entender o cangaço como um fenômeno social, caracterizado por atitudes violentas por parte dos cangaceiros. Estes, que andavam em bandos armados, espalhavam o medo pelo sertão nordestino. Promoviam saques a fazendas, atacavam comboios e chegavam a sequestrar fazendeiros para obtenção de resgates. Aqueles que respeitavam e acatavam as ordens dos cangaceiros não sofriam, pelo contrário, eram muitas vezes ajudados.

Esta atitude fez com que os cangaceiros fossem respeitados e até mesmo admirados por parte da população da época. O cangaceiro - um deles, em especial, LAMPIÃO tornou-se um personagem do imaginário nacional, ora caracterizado como uma espécie de Robin Hood, que roubava dos ricos para dar aos pobres, ora caracterizado como uma figura pré-revolucionária, que questionava e subvertia a ordem social de sua época e região. O nosso livro - "A VIDA DO CEL. ARRUDA CANGACEIRISMO E COLUNA PRESTES", que este teve já vários enfrentamentos com o bando de Lampião, nós contamos o fato da história do ferimento no calcanhar de Lampião que passamos a reproduzir: "Uma outra astúcia e habilidade de Lampião. Lampião vinha a cavalo com Antônio Ferreira, em dois cavalos meeiros, esquivadores, o Teófanes de Ferraz, o mesmo que prendeu Antônio Silvino, em Taquaratinga-PE, vinha com oitenta praças. Encontravam-se nos espigões das serras: Serra Pintada e Serra do Catolé. A força volante deu uma descarga e Lampião deitou-se no "santo Antônio da cela", e saiu atirando com o mosquetão para trás e recebeu um balaço no calcanhar. Desse balaço, os cangaceiros fizeram um rancho no mato, na ponta da serra. Depois Cícero Costa visitou o Lampião. Tinham dezesseis cangaceiros. Lampião anda nu, da cintura para cima, de cueca, de quatro pés, não podia se firmar em pé, sendo tratado por um raizeiro, conhecido por Valões. O Teófanes tomou conhecimento do rancho, voltou novamente e atacou o rancho. Não o cercou porque não tinha lugar disponível para o cerco. Nesse tiroteio morreram Cícero Costa, o Lavandeira, tendo os cangaceiros despitados, conduzindo nos braços Lampião e Antônio Ferreira. Adiante, quiseram deixar Antônio Ferreira, porque já quase morto com um balaço em cima do peito. Foi quando Lampião reagiu: __ Não, se deixar o meu irmão, eu prefiro ficar com ele e morrer com ele. Durante a noite tinha chovido muito e caiu um grande pau de angico enramado. Imediatamente Lampião sugeriu: __ Vocês me deixem aqui debaixo desse angico e saiam deixando vestígio.

Ora, o plano fora um feito admirável. A força volante saiu atirando atrás, passou por cima dos galhos de angico com Lampião embaixo. Os cangaceiros levaram Antônio Ferreira. No dia seguinte, Lampião com sede e com fome, vinha um vaqueiro puxando uma vaca. Uma vaca chocalhada, aboiando e Lampião começou a gritar. O vaqueiro aproximou-se. Era o vaqueiro João Menino, pertencente ao engenho Montevidéu. O Lampião mandou buscar leite. O João Menino veio e ele disse que fosse a Patos avisar a Marcolino. Patos se refere a Patos de Princesa, e não Patos Espinhara. Marcolino juntou sessenta homens e mandou buscar em redes, Lampião e Antônio Ferreira que se escondera em outro ponto. O Antônio Ferreira, apesar do ferimento mais grave, ficou bom, dentro de três meses já andava e conversava. Mas Lampião levou seis meses na casa de Luis Leão, sendo tratado por dois médicos. Luis Leão morava no sopé da Serra de Triunfo, casa grande, caiada, mas vivia em Princesa. Os médicos chamavam-se Dr. Severino Diniz e Dr. João Lúcio. Toda manhã o Sabino saia com uma bolsa de ferramenta, num burro e o Severiano a cavalo preto "estrela" e iam fazer os curativos de Lampião". (fls. 38/39). Nesse sentido - heroico/mitológico - o cangaço é precursor do banditismo que ocorre atualmente nos morros do Rio de Janeiro ou na periferia de São Paulo, onde chefes de quadrilhas também são considerados muitas vezes benfeitores das comunidades carentes. Outro livro de nossa autoria "O PODER DA CIDADANIA", assim explicávamos que o cangaço não acabou: "O antigo e autêntico cangaceiro nordestino caracterizava-se pela sua indumentária: roupa de cáqui, chapéu de couro, com as abas quebradas para cima, duas cartucheiras cruzadas no tórax e uma cercada nos quadris, um rifle, uma pistola, um facão afiado, um bornal, um par de sandálias de rabicho, cabelos puxados à brilhantina, cordão de ouro e o pescoço envolto de patuás e vivia no meio das caatingas ressecadas do sertão. Enquanto que o novo e moderno cangaceiro, que atua em todas as regiões, o distintivo é sua vestimenta de etiqueta, paletó, gravata, sapatos macios, relógio de marca, cabelos escovados, frequenta hotéis e restaurantes de cinco estrelas, mansões e palácios, gabinetes e escritórios notórios, utiliza celular, Internet e televisão, municiado de armas de fogo de alto potencial ofensivo, dinheiro depositado em contas secretas no exterior, desvios e gastos excessivos do dinheiro público. Mudou somente o perfil do cangaceiro da Antiguidade para o gangster da modernidade. A título de ilustração, trazemos à baila, com o fito de arregimentar o nosso artigo, comentários de pesquisadores na matéria e como analisaram o mundo do cangaceirismo": Na visão de Billy Jaynes Chandler:

"O cangaço era um fenômeno exclusivamente do sertão". "Sem encontrar garantia de proteção nem do patrão, nem do Estado, muitas dessas povoações do sertão se transformaram em verdadeiras selvas, onde cada um lutava pela sua sobrevivência. Parece, portanto, que o aparecimento do cangaço esteja intimamente ligado a este estado de desorganização social" ...

"Naquele tempo, a polícia era quase igual aos bandidos, e buscas como estas significavam a destruição quase total das casas e de seus conteúdos, além de maus-tratos aos seus habitantes1".(fls. 167/168). Parabéns! Archimedes Marques, o livro de sua autoria 


"LAMPIÃO CONTRA O MATA SETE", de forma resumida, mas autêntica, resgate toda a história verdadeira do cangaço no Nordeste brasileiro, que os grandes pesquisadores já haviam contado nos livros publicados anteriormente, no entanto, serve também como fonte ideal para os novos aprendizes questionarem este fenômeno social de sangue, suor e lágrimas. João Pessoa, 25 de julho de 2012.

Autor:   Severino Coelho Viana

Enviado pelo escritor do livro "Lampião Contra o Mata Sete", Delegado de Polícia Civil no Estado de Sergipe, e pesquisador do cangaço: Dr. Archimedes Marques

http://www.cangacoemfoco.jex.com.br/arte+cultura+do+cangaco/archimedes+absolve+lampiao+sobre+o+livro+lampiao+contra+o+mata+sete+

Antonio Conselheiro

Ruínas da Igreja velha de Santo Antonio

Antonio Vicente Mendes Maciel, o Antonio Conselheiro, nasceu em 1830, no sertão de Quixeramobim, Ceará. Seu pai foi um ex-vaqueiro, proprietário de uma bodega que queria vê-lo ordenado padre, por essa razão o menino teve acesso a uma instrução formal.

O sonho do sacerdócio, contudo, frustrou-se com o falecimento do pai, em 1855. O futuro conselheiro herdou o comércio e a responsabilidade de cuidar da família, mas acabou falindo, mergulhado em dívidas. 

Casou-se em 1857, sendo depois abandonado pela família. Exerceu as funções de professor, pedreiro, construtor, rábula e caixeiro – teria inclusive, como vendedor ambulante encontrado e acompanhado o Padre Ibiapina nas andanças pelos sertões. Residiu durante algum tempo em Santa Quitéria, onde conviveu maritalmente e teve um filho com Joana Imaginária, mulher mística e escultora de rústicas imagens sacras.

Por volta de 1873, aparece em Assaré-CE, já com a fama de beato, e com as notícias de suas peregrinações pelos Estados do Ceará, Bahia e Sergipe. Ganhou fama, prestigio e seguidores, e começou a ser chamado pela população de Antonio Conselheiro. Seus seguidores, gratuitamente, reconstruíam muros caídos de cemitérios, reforçavam paredes ameaçadas das igrejas, levantavam capelas, construíam pequenos açudes. Virou um homem respeitado no sertão, multidões se formavam para ouvir seus sermões: palavras otimistas, que previam um mundo melhor, feliz, mais próximo de Deus, longe da miséria.

Vista geral de Canudos, depois do massacre

Para as classes dominantes, no entanto, Antonio Conselheiro era um charlatão louco, e estaria desviando as pessoas das atividades produtivas.

Em 1893, Conselheiro e seus seguidores se fixaram numa velha fazenda abandonada do norte da Bahia, às margens do rio Vasa-barris. O beato batizou o lugar de arraial do Belo Monte, embora ficasse conhecido por Canudos. 

Ante o quadro de secas, fome, doenças e exploração vigente no sertão nordestino, o Arraial do Belo Monte tornou-se uma espécie de terra prometida para os pobres da região. 

Em pouco tempo o Arraial assumiu dimensões extraordinárias, há quem estime sua população em 30 mil habitantes. Era um ambiente rústico e pobre, mas nos domínios do Conselheiro não existia fome e reinava um espírito de solidariedade e cooperação. 

A maior parte do que era produzido era repartido entre os moradores. Essa comunidade alternativa, cooperativa, assustou os poderosos. Os latifundiários perdiam a mão-de-obra sertaneja. A igreja católica perdia os seus fiéis.

 

Por outro lado, era evidente que o Conselheiro pregava contra a república, estimulando a que não se lhe pagassem tributos e até espantasse os funcionários que representavam a justiça e o casamento civil. Canudos assemelha-se às incontáveis comunidades rebeldes religiosas, lideradas por fanáticos, que reúnem ao seu redor uma multidão de fiéis aos quais é assegurada não só a salvação, mas a imortalidade.

Seguidores do Conselheiro prisioneiros 

Usando como argumento principal o fato de Antonio Conselheiro fazer críticas à república – cuja proclamação em 1889 não alterou em nada a penúria em que vivia grande parte do povo nordestino – as camadas dominantes exigiram a destruição do Arraial, o que acabou acontecendo depois de três expedições anteriores fracassarem na tentativa de acabar com o aglomerado.

Mesmo com o arraial cercado pelo exército, a população lutou até o fim. Umas 300 mulheres, velhos e crianças se renderam. Alguns homens sobreviventes foram degolados e os que resistiram até o fim foram mortos a golpes de baionetas na luta corpo-a-corpo que se travou dentro do arraial, no dia do assalto final, em 5 de outubro de 1897. 

Antônio Conselheiro, com a saúde fragilizada, morreu dias antes do último combate. Ao encontrarem seu corpo, deceparam sua cabeça e a enviaram para que estudassem as características do crânio de um louco fanático.

Pesquisa:
História do Ceará, de Airton Farias
A Guerra de Canudos e Sertões. Disponível em
http://educaterra.terra.com.br/voltaire/500br/canudos.htm
fotos

Zé do Telhado


Zé do Telhado alcunha de José Teixeira da Silva, nasceu a 22 de Junho de 1818 na Aldeia de Castelões, comarca de Penafiel. 

Foi um famoso salteador Português do século dezanove e era chefe da quadrilha mais famosa do Marão. É conhecido por "roubar aos ricos para dar aos pobres" e por isso muitos consideram-no como o Robin Hood português. 
No dia 3 de Fevereiro de 1845 casou-se com sua prima Anna Lentina de Campos.

Zé do Telhado foi apanhado pelas autoridades em 31 de Março de 1859 quando tentava fugir para o Brasil, e preso na Cadeia da Relação , onde conhece Camilo Castelo Branco. 
Em 27 de Abril de 1861 foi condenado ao degredo, em África.

José Teixeira da Silva desembarcou em Luanda, seguindo para Malange, onde viveu cerca de um ano. 
Palmilhou cada légua das terras da Lunda. Fez-se negociante de borracha, cera e marfim. Casou-se com uma angolana, Conceição, de quem teve três filhos. Cresceu-lhe a barba, até ao umbigo. 

angola-africa.forum-ativo.com

Era, para os angolanos, o “quimuêzo” – homem de barbas grandes. 
Sepultado na aldeia de Xissa, a meia centena de quilómetros de Malange, o povo ergueu-lhe um mausoléu. Hoje, fazem-se romagens à campa do mito.

http://angola-africa.forum-ativo.com/t550p120-regiao-norte-tras-os-montes-minho-e-douro

UMA ESTÓRIA DO SERTÃO (Crônica)

Por: Rangel Alves da Costa(*)
Rangel Alves da Costa

Nos tempos mais antigos, idos em que o sertão era marcado pela força coronelista, pela arrogância jaguncista e pela submissão do autêntico e empobrecido sertanejo – sem esquecer, porém, da lutas cangaceiras que se travavam noutras veredas -, teve lugar um acontecimento que até hoje é relembrado debaixo dos pés de pau, em tardes de proseado.

E diz que certa feita o homem mais poderoso da região, o Coronel Querilânio Bonome, senhor de um mundão de terras que não acabava mais, fora bichos de monte e jagunços de rodo, deu uma cusparada na varanda do casarão e depois chamou um cabra para ordenar que fosse chamar o jagunço Tervino. E que o pistoleiro estivesse ali antes que aquele cuspe secasse. E apontou.

Em menos de dois minutos o mais famoso dos jagunços estava na presença de seu patrão, fazendo reverência com o chapéu e dizendo que estava à ordem pro que desse e viesse. Antes de falar sobre o que realmente queria, o Coronel Bonome olhou para o local da cusparada e depois levantou o olho pra perguntar onde estava aquele que havia ido lhe dar o recado.


Sem saber nada do que se tratava, Tervino disse apenas que talvez ele tivesse ido tomar algum chá de planta medicinal, pois sem um pingo de sangue como estava e tremendo feito vara verde, só podia estar doente. E o coronel nem pensou duas vezes pra dizer:

“Quando vosmicê pisou aqui na varanda uma cusparada que dei havia acabado de secar. Gosto de castigar a quem não cumpre minhas ordens dentro do tempo acertado. E vosmicê chegou quando o cuspe já havia secado. Entonce o jeito que tem é mandar dar um jeito naquele cabra, e de um jeito que ele num cuspa nunca mais nessa vida. Entendeu o que quero dizer? Vosmicê tá encarregado de mandar outro cabra fazer o serviço, pois tenho outra missão que vai lhe ser mais fácil do que imagina...”.

O jagunço era homem perigoso demais, pau pra toda obra segundo o desejo do seu patrão, e por isso mesmo já havia tocaiado e derrubado mais de vinte, desde inimigo comum do coronel até desafetos poderosíssimos, da mesma patente coronelista sertaneja. Contudo, mesmo trazendo consigo essa sina de matador, fazia tudo pra não puxar o gatilho se antes de fazer a derrubada conhecesse um motivo injusto para uma morte tão medonha e covarde.

Por isso mesmo já tinha no pensamento que ia mandar o coitado marcado pra morrer pra bem longe dali, e depois dizia que o homem já tinha ido pro beleléu do mal repentinamente acometido. Mas isso ficaria pra depois, pois em seguida perguntou ao coronel o que pretendia que ele fizesse daquela vez. Coisa boa não seria, disso tinha certeza. E se pôs a ouvir a ordem da cobra velha, jaracuçu da pior espécie. E lhe chegaram as palavras:

“Vosmicê sabe muito bem que nunca fui homem de aguentar nem desaforo nem desfeita de ninguém, seja padre ou governador. E sabe também que quem atravessa o meu caminho tem de sair por bem ou por mal. Imagina vosmicê que já faz mais de vinte anos que não faço inimizade, não arrumo confusão nem mando derrubar ninguém por causa de terra. O último a se lascar foi o besta do Coronel Elesbão. E agora me surge uma coisa sem pé nem cabeça, coisa só pra tomar espaço no meu tempo. Não é coisa do outro mundo, é verdade o que vou dizer. Conhece João do Burro, aquele mesmo que tem uma filepinha de terra lá vizinha da minha Fazenda Taquara? Sei que conhece. Pois bem. Preciso ajuntar a nesga de terra dele com a minha e o cabra se nega a vender pelo preço que eu mandei oferecer. E diz que só aceita por dez vezes mais. O cabra safado deve ter enlouquecido. Como ele tem uma filha muito bonita, morena cheirosa, ainda cheia das purezas da mulher, então num queria que a bichinha ficasse sem pai. Mandei oferecer o dobro do oferecido e o safado mangou da cara do mensageiro. Então agora cabe a vosmicê, Tervino, cuidar do negócio. Mas agora não vou oferecer nada não. Tocaie o bicho, faça uma emboscada bem feita, e acerte bem na testa do bode velho. Quando o corpo for encontrado e a família empobrecida estiver chorosa, na precisão, apareça por lá e bote esse dinheiro aqui na mão da mocinha e diga quem lhe mandou como auxílio de entristecimento. E num esqueça de dizer a flor sertaneja quem tem muito mais desse aqui pra ela, bastando que ela queira...”.

O coronel falava numa tranquilidade de sacristão. Acendeu o cachimbo de fumo importado, entregou o maço de dinheiro na mão do jagunço e antes que este saísse ainda avisou: “Amanhã já quero esse trabalho feito. Já tô sentindo o cheiro da flor mimosa. Agora anda, vai, vai. E não esqueça de mandar matar também o outro que deixou o cuspe secar...”.


Antes de sair, Tervino prometeu que tudo seria feito segundo o determinado pelo patrão. Mas botou o pé do lado de fora da varanda meio acabrunhado com essa situação. Havia percebido que lhe havia sido repassada a responsabilidade por mais uma morte desnecessária, injusta, desumana, sem cabimento algum. Já estava na hora de o coronel saber que as coisas não eram mais assim como ele queria não, tudo na bala, no sangue, na morte, na covardia da emboscada. E geralmente de gente pobre e inocente.

Decidiu que não cumpriria a ordem recebida de jeito nenhum, até mesmo porque andava de olho caído por aquela mocinha que agora o coronel queria se intrometer. Se corresse até lá para contar sobre a encomenda da morte talvez a família ficasse agradecida e o recebesse para um café de vez em quando. Então seria a porta aberta para adentrar naquele coração agrestino. Mas antes de ir até lá resolveu fazer outra coisa não menos importante. E seria o fim daquela história toda de perseguição, tocaiagem, encomenda de cabeça de gente.

Correu até o rapazinho que também já estava marcado pra morrer, aquele mesmo do cuspe, contou-lhe a situação e fez uma surpreendente proposta. E era aceitar ou perder a vida. E disse ao quase morto que daria aquele pacotinho de dinheiro que o coronel havia mandado entregar a outra pessoa se ele fosse até a varanda do casarão e acertasse em cheio o cabrunquento do velho coronel. E entregou sua própria arma carregada e o dinheiro.


Cinco minutos depois ouviu o disparo. Correu até lá para contar tudo aos outros jagunços e acalmar a situação, afinal de contas já havia até passado o tempo de algum cabra valente prestar contas com o safado do velho mandante de pistolagem. Mas assim que chegou defronte ao casarão parou surpreendido.

De lá de dentro, tranquilamente e de arma na mão, saiu João do Burro, aquele mesmo pai da mocinha e que o coronel já havia encomendado sua morte. Sabendo que morreria a qualquer momento, se antecipou e reverteu a situação. O jagunço mandou que ele seguisse sem medo, que fosse embora cuidar da família. E depois entrou na varanda e deu uma cusparada por cima do coronel estrebuchado no chão.

(*)Poeta e cronista
e-mail: rac3478@hotmail.com
http://blograngel-sertao.blogspot.com.br/2012/07/uma-estoria-do-sertao-cronica.html



LONDRES 2012


Por: Clerisvaldo B. Chagas - Crônica Nº 829
Clerisvaldo B. Chagas

Enquanto muitos indivíduos vão levando seus países às guerras, surgem grandiosos exemplos de amizade entre as nações. Os sentimentos egoístas, mesquinhos e animalescos de cérebros doentios, parecem não enxergarem os belos matizes que ornamentam a paz. É como se as próprias forças do mal penetrassem no couro desses atrasados que agem como bestas sub-humanas nesse mundo ainda infelizmente tão primitivo. Apesar das inúmeras advertências do quase número total de religiões do mundo, muitos animais de duas pernas continuam se apoderando descaradamente de tudo que podem, esquecidos ou duvidando de que ninguém leva nada para o além. Quando não é a ambição do possuir, à custa de muito sofrimento alheio, é o rato que rói por dentro pelas rédeas de espinhos do poder. O que faz um homem entrar num cinema e matar os espectadores para ele desconhecidos? Por que o dirigente da Síria teima em matar seus compatriotas? Assim outros estão agindo no planeta. Com guerra ou sem guerra não querem largar o poder que possui a doçura da ilusão de mandar em outras criaturas e o uso da verba pública que não sacia nunca a voracidade da avareza.

Abertura dos jogos olímpicos. (Fonte: smn).

Felizmente surgem na marcação do calendário eventos importantíssimos para a humanidade como as Olimpíadas que oferecem o fantástico poder da amizade entre os povos. Londres teve a capacidade de levar para o seu território nada menos de que 204 nações. Todos os países estão ali representados, cada um com sua numerosa ou minúscula delegação, mas sentindo o prazer que não existe preço do abraço fraternal que o planeta Terra oferece aos seus habitantes. Calculamos que todos os países juntos comemorando o encontro seja o máximo a que a humanidade pode alcançar. E se esse titânico encontro fosse em comemoração à última guerra, ao último miserável, à última discriminação de cor do Globo, seria aplaudido até pelos que fazem os mundos superiores. Mas, dentro do que se pode fazer, está aí à festa bonita em meio a uma crise financeira que se arrasta pelos continentes ante a choradeira de quase todos. E como dissemos no início, o exemplo de fraternidade entre os homens não comovem os constantes troar de canhões em território Sírio e em outros lugares.
Aproveitemos, então, a parte boa e torçamos pelos nossos atletas que conduzem a bandeira da esperança. Pelos menos são essas lágrimas diferentes; surgidas das derrotas, passam como o vento; se brotam das vitórias, são dádivas para o Ego. Aplausos a LONDRES 2012.